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Quando foi que você começou a escrever?

Sou filha e neta de leitores e cresci com acesso a muitos livros e gibis. Esses estímulos vitaminaram minha imaginação, assim como o contato com a natureza. A gente precisa tanto da leitura quanto do silêncio e da solitude para escrever. Quem lê não só alimenta as ideias, também cria repertório de estilos e narrativas. Com 9 anos de idade escrevi a primeira história. Chamava-se “Azulzinha” e era sobre uma coelha azul e falante, diferente do resto da família. Uma história inspirada em Monteiro Lobato, na paixão por animais e na vontade de entender o que eles pensam e sentem. Nas férias de Verão, comprei um caderno em branco no armazém, uma caneta e simplesmente comecei a escrever. Nunca terminei a história da Azulzinha, mas ela serviu para me dar a confiança necessária para enfrentar as páginas em branco pelo resto da vida.

Só sei escrever sobre o que conheço. As ideias vêm das vivências, daquilo que aprendi em pesquisas e leituras, e há também aquelas que surgem de um lugar que eu não sei explicar qual é, nem me preocupo muito onde ele fica, só tenho o cuidado de manter abertas as portinhas no meu coração que me ligam com esse mundo louco e mágico da criatividade humana. Acho que todo mundo nasce com essas portinhas. As crianças as têm sempre abertas, alguns adultos se esquecem delas e por descuido as fecham. Todo escritor e contador de histórias precisa manter as portinhas abertas.

Tudo. Uma vez, no século passado, quando não existia internet, passei algumas semanas na Ilha de Santa Bárbara, em Abrolhos, bem longe de terra firme. Quando acabaram os livros, revistas e gibis comecei a ler a bula dos remédios.



Aprendi a nadar, mergulhar, amar e respeitar o mar ainda pequena. Por muito tempo achei que tinha nascido gostando de baleias. É que a gente esquece o que vivemos nos primeiros anos de vida. Fui alfabetizada com 5 anos, e o prêmio e desafio aos alunos alfabetizados da minha escola era ler sozinhos um livro escrito por nossa professora. Eu já tinha publicado o guia sobre as baleias e golfinhos do Brasil quando minha mãe encontrou esse livro. Seu título, qual era? “A baleia azul”! As duas palavras que li pela primeira vez sozinha – baleia e azul – ficaram guardadas no meu coração. Depois, quando já era uma garota mais crescida, assisti um seriado na tevê que tinha um golfinho como personagem principal: “Flipper”. Eu era apaixonada pelo Flipper e pelo lugar em que viviam as crianças que brincavam com ele. Aos 18 anos, conheci as ilhas onde esse seriado foi filmado, as Florida Keys, no extremo Sul dos Estados Unidos. Ali eu olhei dentro dos olhos dos golfinhos pela primeira vez. Foi uma paixão tão forte que me levou a voltar para o Brasil disposta a encontrar e ajudar a proteger os cetáceos que deveriam existir nesse nosso marzão, mas ainda eram pouco conhecidos pela Ciência.

Foi por causa das baleias que aprendi a amar os corais e os ambientes coralíneos. Em Abrolhos, realizei o sonho de encontrar com as gigantes e as fotografar, colaborando com o Projeto Baleia Jubarte. Nas águas que tinham acabado de se tornar nosso primeiro Parque Nacional Marinho, mergulhei em seus incríveis chapeirões e recifes e aprendi com os pesquisadores e fiscais do parque o quanto são importantes e formidáveis os bichos que constroem as maiores estruturas vivas do nosso planeta. Os ambientes coralíneos são os equivalentes marinhos das florestas tropicais: coloridos, cheios de vida e diversidade. Eles nos dão abrigo, comida, beleza, remédio, saúde e servem de berçário e parque de diversão para baleias e golfinhos. Como não amar os corais depois que os conhecemos?

São cinco os meus bichos favoritos: sou perdidamente apaixonada por gatos-do-mato, suçuaranas, elefantes, baleias e golfinhos. Ai, tem os araçaris também, e esqueci de outros que também adoro, podem ser 10 favoritos? Ou 20?

Sempre gostei do objeto livro caprichado. Na produção do meu primeiro livro, o guia dos cetáceos do Brasil, conheci a designer Silvia Negreiros, na editora Nova Fronteira. Amei participar de todo o processo da feitura do livro, aprendendo muito com os profissionais da casa, com o estímulo da editora Lúcia Jurema Figueiroa. Fiz os três primeiros livros na Nova Fronteira e formei uma dupla com a Silvia, foram dois anos de muito aprendizado. Para meus novos projetos, eu queria caprichar ainda mais, ainda sem controlar também a distribuição comercial dos livros, então Silvia e eu fundamos uma empresa de produção editorial, a Manati. Em poucos anos estávamos também comercializando livros e essa parceria durou mais de duas décadas.

Em obras ilustradas, as imagens são parte integrante da narrativa, por isso desde sempre considerei meus parceiros ilustradores como coautores dos livros. Nunca tentei desenhar com a mão dos artistas, ao contrário, como tive a sorte de trabalhar com craques das artes plásticas, desde o primeiro livro valorizo muito o que eles acrescentam ao meu trabalho. A mesma coisa vale para o projeto gráfico. Um bom projeto gráfico pode enriquecer um livro, enquanto um projeto fraco pode prejudicar até as melhores ilustrações e textos. A escolha da fonte tipográfica, por exemplo, o tamanho das letras, o arejamento entre as linhas, a qualidade da impressão, tudo soma ou diminui um livro. Ao longo da minha carreira formei duplas muito legais com ilustradores, além do luxo de ter a Silvia Negreiros como designer de quase todas as minhas obras.

Um livro encantador para crianças deve cativar também jovens e adultos. Mas escrever para crianças e jovens exige dominar técnicas e linguagem especiais. Quanto mais infantil o público maior o desafio. Há ainda desafios específicos, como criar livros para crianças em fase de alfabetização, por exemplo, ou álbuns ilustrados para jovens. Crianças e jovens têm repertórios de conhecimentos, vivências e vocabulário diferentes dos adultos. Quanto mais simples a linguagem empregada nas narrativas, mais sofisticado tem que ser o autor. Complicar é muito fácil, simplificar e ser grande ao mesmo tempo é o desafio da arte de escrever e de ilustrar.

Adoro os clássicos, assim como gosto de descobrir novos talentos. Acho que meus livros e autores favoritos são aqueles que leio muitas vezes ao longo da vida. Para responder a essa pergunta eu lembro dos livros que levo de uma casa para outra quando me mudo, ou daqueles de que tenho saudades quando estou viajando, ou daqueles que li as obras completas. Então penso em Guimarães Rosa, Machado de Assis, Oscar Wilde, Fernando Pessoa, Sophia de Mello Breyner Andresen, Cecília Meireles, Carlos Drummond de Andrade, Karen Blixen, George Orwell, Quino, René Goscinny e Henfil, esses todos estão sempre comigo.

Nenhum livro é bom para todas as pessoas, nem mesmo para a mesma pessoa em todos os momentos da sua vida. Um bom livro é aquele que encanta o seu leitor. Um bom livro para mim é aquele que me cativa. Como editora, sempre tive o cuidado de explicar aos autores que submetem suas obras à minha avaliação que ao escolher o que vou editar não estou selecionando o que considero “bom” apenas, e sim as obras que julgo excepcionalmente importantes, interessantes ou belas para o público para o qual eu tenho canais de distribuição. Digo “excepcionalmente” porque tenho um critério básico: o livro impresso tem que valer, no mínimo, a árvore que foi sacrificada para produzir o seu papel.

Gosto mais dos meus livros que sobrevivem ao tempo. Nem todo livro tem que viver por muitos anos. Alguns naturalmente ficam desatualizados ou caducam, especialmente os informativos. Eles podem ter sido importantíssimos para mim ou para meus leitores por algum tempo, mas ao longo dos anos perecem, e tudo bem.

Tive a honra e alegria de traduzir uma das maiores autoras da Índia, Anushka Ravishankar, foi um exercício maravilhoso. Para mim, o livro “Elefantes Nunca Esquecem” é uma obra-prima da literatura mundial. Traduzir livros é difícil e ao mesmo tempo delicioso.

Imensa. Tenho curiosidade insaciável por diversos assuntos do conhecimento humano. Acompanhar a história e os avanços da Ciência é apaixonante. Por isso sou fã de museus, de revistas e obras de divulgação científica. A Arte e a Ciência enriquecem a minha vida e a cultura é o que nos faz humanos. 

Comecei a fotografar com 7 anos, em 1975. Eu já queria ser fotógrafa de natureza, meu primeiro clique foi de uma pomba pousada no parapeito do apartamento de Ipanema. Era o tempo da fotografia analógica, do filme em película, das câmeras muito simples. Até uns 18 anos quase todas as minhas economias e presentes se transformavam em rolos de filmes, em câmeras melhores e em revelações e ampliações. Estudei um pouco de fotografia no colégio em Oxford, na Inglaterra, com 17 anos. Depois, fui aluna do Centro Universitário de Fotografia da PUC-RIO, que tinha excelentes cursos de extensão. Da PUC fui trabalhar em um estúdio de publicidade, com o Fábio Vidigal. Com ele aprendi a manejar câmeras de grande formato e me tornei uma laboratorista de mão cheia. Quando consegui a oportunidade de trabalhar com baleias, pude começar o projeto do levantamento fotográfico das baleias e golfinhos do Brasil e comecei a publicar em livros, revistas e jornais.

Silvia foi minha sócia por mais de vinte anos, mas antes de tudo é uma das pessoas mais queridas da minha vida. Dizem que somos parecidas fisicamente, tem gente que nos confunde, juram que somos irmãs, mas nossos temperamentos são diferentes e complementares. Eu sou agitada, ela é calma. Eu sou atirada e tagarela, ela é tímida. Eu sou medrosa para umas coisas para as quais ela é confiante. Ela é medrosa para outras (especialmente baratas) para as quais eu sou valente. Silvia tem uma classe para o design gráfico, um senso crítico para textos e um bom gosto ímpares. Viajar com ela e Mariana Massarani é uma aventura estética que vale por um doutorado em design.



Desde que Mariana ilustrou o livro “De bem com a vida” percebi que tinha ganhado uma amiga, uma parceira literária e uma dupla destemida para aventuras naturalistas. Temos muita afinidade, ambas adoramos Ciência e Arte, e damos boas gargalhadas juntas. Fizemos muitos livros e viagens juntas, colaboramos com projetos de pesquisa e conservação marinha também. Mariana é uma das pessoas mais cultas e que já conheci, suas dicas de leitura, de filmes, séries e programas culturais são sempre incríveis. Estamos sempre planejando novas criações, passeios e viagens.

Conheci Roseana na virada do século, quando me tornei sua editora. Li seus poemas antes de conhecer a poesia em pessoa. Foi amizade à primeira vista com ela e seu marido, o maravilhoso jornalista espanhol Juan Arias. Roseana é uma das maiores poetas para a infância de todos os tempos. Sua poesia para jovens e adultos também é forte e bela. Lida por milhões de pessoas nos países em que se fala a língua portuguesa, poliglota, cultíssima, de uma sensibilidade e força extraordinárias, ela tem um senso de justiça social e um compromisso com a Educação que norteiam tudo o que faz. Amiga de todas as horas, me transformou em coautora de dois livros que fizemos juntas. As duas preferimos morar na montanha ou longe das grandes cidades, mas mantemos um contato próximo até quando há um oceano entre nós. É como se a poesia dela tivesse criado raízes profundas em mim.

Desde que comecei a trabalhar com baleias e golfinhos, me encantei não só pela sabedoria científica, mas também pela ética, seriedade profissional e personalidade sensível e afetuosa da Liliane. Nos tornamos grandes amigas, companheiras de embarques e aventuras fantásticas, coautoras de trabalhos pioneiros. Descobrir o mundo das baleias e golfinhos ao seu lado é uma honra. A nossa whalewoman brasileira é revisora científica de tudo o que eu publico sobre baleias e golfinhos. Já são mais de 30 anos juntas na proa! Que venham muitos outros!

Tive a alegria de editar um dos livros mais importantes da Flávia: “Mururu no Amazonas”. Somos leitoras uma da outra e temos uma troca artística deliciosa, aprendo muito com ela sobre cinema e televisão. Como todas as crianças brasileiras, sou fã de seu trabalho como roteirista no DPA e em outras séries, e tenho certeza de que ainda irei em um parque temático da Pilar, dos Detetives do Prédio Azul ou outros personagens incríveis que ela ainda vai inventar. Trabalhando no Coral Vivo, fizemos um filme juntas de animação que foi uma universidade para mim: “Cora e os corais”.

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